As ondas de leste foram descobertas logo após o início da confecção regular de cartas de tempo para a região equatorial (Índia, 1875).
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Figura 1: Regiões onde observa-se ou há indícios de propagação das ondas de leste. Fonte: Berry et al (1945). |
Até o final do século XIX, estava bem estabelecido que durante os meses de Junho a Setembro, centros de baixa pressão vindos de leste cruzavam o continente e adentravam na Baía de Bengal, ajudando na formação de depressões monçônicas no norte da baía (estas depressões são famosas por sua alta energética e pelos distúrbios induzidos no oceano e conseqüentemente nas regiões costeiras como Bangladesh).
Além disso, em períodos pré e pós-monções, suspeitava-se que os ciclones tropicais da Baía de Bengal eram remanescências de distúrbios oriundos do Mar da China e Pacífico Oeste Central; em 1936 foram publicadas cartas que indicavam a trajetória de ciclones originados no Pacífico, a oeste de 150°E e que se moviam para a região da Índia.
Nesta mesma época se reconhecia alguns padrões semelhantes em outras regiões tropicais, como a costa oeste da África e o Atlântico Leste.
Do ponto de vista observacional, Riehl (1945) foi o primeiro a fornecer uma estrutura 3D detalhada destes distúrbios no Mar do Caribe, consagrando a idéia de que as ondas de leste ocorrem em toda a região tropical e que sua estrutura varia de uma região para outra.
Apesar de os alísios estarem relacionados com condições de tempo estáveis, em algumas regiões dos trópicos estas situações tranqüilas são interrompidas por distúrbios que por se moverem com os alísios para oeste e apresentarem configurações ondulatórias nos campos de vento e pressão, são chamados Ondas de Leste. Segundo Berry et al. (1945), estes distúrbios ocorrem em diversas partes dos trópicos (figura abaixo), sendo que estudos extensivos têm sido realizados no Atlântico Tropical Norte (ATN), no Caribe e na região do Pacífico Tropical Oeste (PTO).
O modelo clássico de descrição das ondas de leste foi desenvolvido por Riehl (1954) na região do Caribe. Riehl foi o primeiro a fornecer uma descrição 3-D detalhada dessa onda. Segundo ele, as ondas de leste são oscilações nos campos de pressão e vento, que se encontram em fase na superfície. O cavado estende-se em direção ao pólo; possui orientação NE-SW no HN (Figura 2); e inclina-se para leste com a altura (figura 3). Na dianteira do cavado, há divergência e movimento subsidente nos baixos níveis, com características de bom tempo; e na retaguarda há convergência nos baixos níveis com predominância de forte movimento ascendente e convecção profunda.
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Figura 2: Modelo de ondas de leste: linha de corrente em 4500m. Inclinação horizontal do eixo do cavado de NE-SW. Fonte: Riehl (1954). |
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Figura 3: Modelo de ondas de leste: secção vertical do vento em 15ºN. Profundidade da camada úmida (linha tracejada). Inclinação do eixo do cavado para leste. Fonte: Riehl (1954). |
Relativa sutileza em intensidade:
A amplitude das ondas de leste migratórias é bem menor do que os cavados e cristas nas latitudes tropicais, não sendo facilmente identificáveis em cartas sinóticas; assim é necessária uma análise especial para detectá-las.
Ausência de uma estrutura uniforme:
As ondas de leste estão imersas no escoamento zonal, que por sua vez, apresenta estruturas distintas de região para região e de estação para estação.
Ausência de dados nos trópicos:
Grande parte dos trópicos é coberta por oceanos, sobre os quais é difícil estabelecer observações frequentes; mesmo sobre os continentes, não há uma rede considerável de observações.
Estudos de caso com cartas sinóticas:
A partir do estudo de alguns casos típicos, os meteorologistas sinóticos fazem uma generalização a respeito das propriedades destes sistemas sinóticos.
Análises de imagens de satélite e ar superior:
Hall (1989) sugeriu que através de imagens de satélites e seções temporais de vento de altos níveis, no início de 1986, que características similares às ondas de leste no HN afetariam a ilha de Ascenção, localizada no ATS; e que provavelmente tais distúrbios dispararam fortes sistemas precipitantes no período de suas passagens. Hall sugeriu também que a origem destes distúrbios estava na região da África Central. (Figuras 4 e 5).
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Figura 4: Diagrama esquemático da estrutura em baixos níveis das ondas de leste no HS. As setas duplas indicam o movimento vertical e as negras o escoamento horizontal. Fonte: Hall (1989). |
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Figura 5: Diagrama esquemático da estrutura vertical das ondas de leste no Atlântico Tropical Sul. Fonte: Hall (1989). |
Através de um mosaico de situações para determinado cinturão de latitude, é possível identificar o comprimento de onda e a velocidade de propagação típicos.
A partir de séries temporais de parâmetros meteorológicos (vento, temperatura, umidade, etc) obtidas em determinada estação, as técnicas de análise espectral podem extrair importantes informações sobre períodos e correspondentes amplitudes.
Apresenta a vantagem de avaliar detalhes, o que não pode ser feito com cartas sinóticas; além disso, estações relativamente distantes podem ser analisadas independentemente, o que não é possível com cartas.
A partir das considerações obtidas com as técnicas anteriores, é possível avaliar a importância relativa entre os diversos termos das equações do movimento (análise de escala); essas equações podem ser integradas no tempo de modo a fornecer características detalhadas das perturbações.
As ondas de leste existem na região tropical de ambos os hemisférios; no entanto, são mais marcadas durante o período junho-setembro no HN e são mais estudadas no HN.
Dificilmente detectáveis a leste de 30°E, gradualmente intensificam-se e atingem máxima amplitude antes de cruzar a costa oeste da África; existem mudanças, mas na média:
No HS também ocorrem ondas de leste, sendo que são mais marcantes durante o verão do HS, nas vizinhanças da ZCIT no Pacífico Oeste Central, no norte da Austrália e no Índico Sul; são elas que propiciam a formação de tempestades e ciclones nos lugares citados.
Durante o verão do HS, existe outro cavado “equatorial” situado alguns graus ao norte do equador; as ondas de leste associadas à ZCIT (que ocorrem um pouco ao sul do equador) muitas vezes interagem com estes cavados formando distúrbios meteorológicos significativos (Malasia, Baía de Bengal); além disso, as famosas chuvas associadas às monções do nordeste também se intensificam nestes meses, devido à interação com as ondas de leste.
Consideram-se 5 possíveis fontes de energia para as ondas de leste:
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Figura 6: Diagrama de longitude versus tempo de desvios da componente meridional do vento, em relação à média do trimestre, filtrados para o intervalo de 2 a 10 dias, para DJF e MAM, do nível de 650hPa, ao longo do equador. Estão plotados somente os desvios positivos. Intervalo dos contornos: 1m/s. |
6.1. Segundo Yamazaki & Rao (1977)
Aplicam técnica de secções tempo-longitude de cinturões zonais para estudar as ondas de leste:
Nestes mosaicos, bandas de nebulosidade bem definidas com inclinação de leste para oeste com o tempo podem ser identificadas, podendo fornecer estimativas sobre sua velocidade de propagação (pela própria inclinação), sua freqüência (pela ocorrência das linhas inclinadas) e também sobre seu comprimento de onda (compondo as informações anteriores). Assim, lugares sem cobertura amostral, como os oceanos por exemplo, podem ser estudados via imagens de satélite. Em algumas localidades e em certos períodos do ano, poucos destes distúrbios podem se transformar ou induzir a formação de violentas tempestades tropicais.
No caso do Atlântico Sul, não ocorre este tipo de situação em nenhuma época do ano e então surge a questão: existem distúrbios no Atlântico Sul similares aos das outras regiões tropicais?
Usando secções tempo-longitude para o ano de 1967, desde 20°N até 20°S em cinturões de 5° de latitude para toda a extensão longitudinal do globo foi possível detectar a existência destas linhas inclinadas no Atlântico Sul somente durante o inverno do HS (JJA).
A secção 0°-5°S pareceu apresentar menor nebulosidade sobre o Atlântico Sul; entretanto, nas secções 5°-10°S e 10°-15°S, várias linhas de nebulosidade podem ser traçadas sobre a extensão do Atlântico Sul, sobre a costa do Brasil até cerca de 40°W.
Em todas as secções, uma zona de nebulosidade permanente foi detectada por volta de 080°W, a oeste da costa oeste da AS; nesta região as águas de superfície são muito frias e tal nebulosidade permanente pode estar associada a stratus ou mesmo nevoeiro.
Sobre o Pacífico, o Índico e a costa leste da África, diversas linhas podem ser detectadas; sobre o Atlântico, a oeste de 10°E as linhas não são tão evidentes, mas podem ser detectadas.
A nebulosidade parece dissipar sobre o continente sul americano, com poucas exceções; já sobre a costa, as linhas são mais marcantes.
Uma inspeção visual do mosaico referente à tira 5°-10°S, indica que a periodicidade das perturbações sobre o Atlântico Sul é de 4-5 dias (20 linhas em 3 meses), a velocidade de propagação de cerca de 10 m/s (~40° de longitude em 4 dias) e um comprimento de onda da ordem de 4000 km.
Outros mosaicos em outros invernos também sugerem que as linhas de nebulosidade podem ser traçadas desde a costa da África até um pouco adentro da costa do Brasil; assim, é interessante notar que o inverno é a estação chuvosa no nordeste, mas esta chuva restringe-se ao litoral.
6.2. Segundo Ferreira, Chan e Satyamurti (1990)
Analisa as principais características e estruturas ondulatórias das ondas de leste no Atlântico Equatorial durante o FGGE, usando dados de vento do NMC (2,5° de resolução) no período DEZ78 a NOV79, para a região 22,5°N-22,5°S e 0°-085°W.
Através de diagramas de Hovmöller, que são secções temporais dos desvios da componente meridional do vento, para latitudes próximas ao equador é possível estimar visualmente as características do distúrbio ondulatório, tendo sido usado o nível de 850 hPa para construir os diagramas, uma vez que as ondas de leste adquirem maior intensidade na baixa troposfera.
Distribuição de ocorrência de distúrbios se propagando sobre o Atlântico Equatorial segundo o trimestre do ano:
Além das estimativas visuais, espectros de potência suavizados da componente meridional do vento foram avaliados para cada faixa de longitude, visando identificar quais bandas de freqüências dos distúrbios estão presentes na área como um todo (cabe dizer que os períodos estimados espectralmente são menores do que os estimados visualmente pelos diagramas).
Figura - Estimativas do espectro de potência suavizado de desvios da componente meridional do vento em relação à média de cada trimestre no nível de 850 hPa e latitude de 5°S de MAM. O eixo das ordenadas está em escala logarítmica.
Para 5°S, as características dos espectros para as bandas de longitude em MAM são:
O pico entre 3 e 5 dias se define melhor entre 020° e 040°W, enquanto que em 60°W, o pico tende para 5 dias.
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Figura 7 |
6.3. Estudo de Caso: Caio Coelho, 1998
A partir das análises do NMC, foram construídos diagramas Hovmöller, que são seções 2-D do tempo versus longitude, no caso da componente meridional do vento de determinado nível e latitude (figura 6), sendo então possível identificar as ondas separadamente e sua propagação com o tempo. Os diagramas são determinados nas latitudes de 0°, 5°S e 10°S nos níveis de 850, 700 e 500hPa, para o período de junho à agosto de 1994. Os eixos dos cavados e das cristas das ondas são identificados pelas isolinhas de zero da componente meridional do vento. Parâmetros básicos das ondas são estimados visualmente nestes diagramas, no qual a velocidade de propagação (), medida em graus de longitude por tempo, é obtida pela inclinação das isolinhas; período médio das ondas (
) é obtido o quociente entre o intervalo de tempo decorrido da passagem consecutiva das ondas na longitude de 35°W pelo número de distúrbios. O comprimento da onda (
) foi determinado através da relação
.
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Figura 8: Diagramas de Hovmöller da componente meridional do vento (m/s), na longitude de 5°S, nos níveis de (a) 850, (b) 700 e (c) 500 do mês de junho de 1994. As regiões hachuradas representam os valores positivos e as linhas destacadas, que unem as isolinhas de zero, indicam o deslocamento das ondas. |
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Figura 9: Secções temporais do mês de junho de 1994, na latitude de 5°S e longitude de 35°W, da componente meridional do vento (a) no nível de 700hPa; (b) perfil vertical da componente meridional do vento entre 1000 e 100hPa; (c) do movimento vertical em 850hPa, e (d) das precipitações registradas em algumas localidades da região nordeste. |
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Figura 10: Onda composta: variação latitudinal dos campos de linhas de corrente em 700hPa, juntamente com as isotacas da componente meridional do vento (m/s) associados com a categoria da onda composta em 5S. Perfis verticais: (a) da componente horizontal do vento, (b) da componente meridional do vento, (c) da vorticidade relativa (10-6 s-1), (d) da divergência horizontal (10-6 s-1), (e) do movimento vertical (10-5 hPa s-1) em coordenadas isobáricas, (f) da umidade relativa (%), e (g) taxa de precipitação (mm/dia) em Natal (RN), em função das categorias da onda composta. As categorias 2, 4, 6 e 8 são respectivamente, as regiões dos ventos de sul (S), do cavado (T), dos ventos de norte (N) e da crista (R). As regiões intermediárias são as categorias 1, 3, 5 e 7. |
Os 13 distúrbios de leste que se deslocaram na latitude de 5°S e que cruzaram a longitude de 35°W, durante o período de 03/06/1994 - 27/07/1994, apresentaram:
1) O que são Ondas de Leste?
2) Como podemos avaliar as ondas de leste e quais os cuidados necessários em sua detecção?
3) Discuta as regiões de intensificação e desintensificação das Ondas de Leste pelo globo.
4) Qual o comprimento de onda, o período e a velocidade característica das Ondas de Leste para cada região?
5) Qual a relação da inclinação do cavado com relação a vertical para as Ondas de Leste?
6) Discuta a relação de liberação de calor latente no desenvolvimento das Ondas de Leste?
7) Quais as fontes de energia para as Ondas de Leste? Resuma com suas próprias palavras cada uma delas.
YAMAZAKI, Y. & RAO, V.B. 1977: Tropical cloudiness over the South Atlantic Ocean, J. Met. Soc. Jap., 55(2), 205-207.
FERREIRA, N.J., CHAN, C.S. & SATYAMURTI, P. 1990: Análise dos distúrbios ondulatórios de leste sobre o oceano Atlântico Equatorial Sul, XI Congr. Bras. Meteorologia, Rio de Janeiro, 462-466.
ASNANI, C.G. 1992: Tropical Meteorology, Chapter 8, Easterly Waves, Indian Institute of Tropical Meteorology.